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A AGRICULTURA E A GLOBALIZAÇÃO DA ECONOMIA

 

INTRODUÇÃO

A abertura afoita das fronteiras econômicas, aliada ao descasamento da correção preços/encargos financeiros nos planos Collor e início do Plano Real (URV), levaram os agricultores brasileiros à maior perda de renda e aumento de encargos da história e como consequencia, à maior crise.

Como podemos observar pelos dados apresentados, enquanto a produção cresceu, a receita caiu.

O Brasil fez o que os outros disseram e não o que fizeram. Os outros países protegem a sua agricultura, subsidiando, financiando em condições adequadas, retirando impostos, garantindo preços e sobretaxando a entrada de produtos que concorrem com aqueles produzidos pelos seus produtores.

O Brasil aplicou as maiores taxas de juros do mundo na agricultura, os maiores impostos, os maiores custos de infra-estrutura (chamado custo Brasil) e ainda deixaram os agricultores à mercê das sobretaxas nas exportações e dos subsídios nas importações.

Disseram para o Brasil que tudo estaria livre, deveriam os nossos agricultores entrar no "livre mercado", serem eficientes e que os incompetentes realmente deveriam deixar de produzir, pois é "assim que o mundo está caminhando". Considerando que os outros não fizeram isso, nosso agricultor é que acabou arcando com tudo, sem proteção e sem condições de defender-se. É a mesma coisa que colocar uma pessoa indefesa, sem nada nas mãos em uma jaula com um leão e dizer: "agora você é livre, faça o que quiser com o felino". Com a luta dos agricultores e suas entidades e o apoio de alguns políticos e autoridades surgiram alguns programas, como o troca-troca, Feaper, Pronaf, Proluz, etc., mas que, por falta de uma mobilização maior e de condições do Poder Público, ajudam, mas não resolvem, pois não atingem à grande maioria e não resolvem a questão de renda.

OS BANCOS

No chamado Plano Collor, em apenas uma medida, os custos financeiros das dívidas dos agricultores aumentaram o saldo devedor dos contratos em mais de 40% (quarenta por cento) acima dos preços e ao iniciar o Plano Real, no período da URV, a correção dos contratos, em poucos meses, aumentou mais de 30%(trinta) por cento acima da variação dos preços, que era medida pela URV. Vejam que em apenas duas medidas o saldo devedor dos agricultores dobrou, o que podemos afirmar que, das dívidas que passaram pelos dois planos, metade é indevida. Pode alguém afirmar que sómente os médios e grandes devem. Nominalmente, em parte, é verdade, mas os pequenos devem nas cooperativas e estas devem aos bancos. Portanto, estas dívidas onde estão embutidos encargos completamente injustos, prejudicam todos os produtores.

O paradoxo que se estabelece é o seguinte: Os milhares e milhares de agricultores que sofrem as consequencias da política supra-mencionada e pagaram os maiores juros do mundo foram taxados pelo Presidente da República de caloteiros e incompetentes, tiveram que realizar uma enorme luta (que levou anos) para conseguir renegociar (muitos casos apenas parte) suas dívidas por um prazo de 7 (sete) anos. Não mais que meia dúzia de "competentes" banqueiros, que recebem os maiores juros do mundo, conseguiram do Governo, da noite para o dia mais de 20(vinte) bilhões, do chamado Proer, com prazo de 30 (trinta) anos para pagar.

A GLOBALIZAÇÃO E O CONSUMIDOR

Um argumento forte utilizado no processo de globalização é o de que objetiva-se o melhor para o consumidor, dando condições a este de ter produtos mais baratos e de melhor qualidade. O mercado deixa de ser o país, para ser o mundo. Não interessa se o produto é produzido aqui ou em qualquer parte do mundo, interessa é o preço e a qualidade. Exemplo: não interessa para quem compra se o trigo é produzido por um agricultor brasileiro ou estrangeiro, o que consumidor quer é preço e qualidade. Por trás deste discurso, nosso mercado fica escancarado aos interesses internacionais para aqui venderem o que quiserem e como entenderem melhor. Trata-se de uma estratégia internacional antiga: em um primeiro momento, colocam no mercado o produto a preços competitivos. Com isso desestrutura a produção local, sucateando a estrutura de porodução. Não existindo mais produção nacional para competir, colocam o preço que querem e o consumidor acaba pagando mais do que se fosse aqui produzido. Não só o consumidor, mas o país e a sociedade como um todo, pois os empregos, impostos e desenvolvimento acabam sendo gerados nos outros países. No caso do trigo, já o Presidente Juscelino não caiu no conto, entendeu a importância estratégica e implantou infra-estrutura incentivando a produção nacional, mesmo quando ofereciam melhores condições do que hoje.

Para entendermos melhor a importância de que todo o ciclo de produção ficar em nosso país, analizando ainda o exemplo do trigo: o produtor recebe R$ 0,15 (quinze centavos) por quilo, sendo que, ao vender, já agregou valores desde o início do plantio, movimentou a economia, gerou empregos, impostos e produção, isto em meio ano. Em poucas, continuando em sua cadeia produtiva, continuando a agregar valores, ao final transforma-se em um quilo de bolo, valendo R$ 6,00 (seis reais). Isto é, uma agregação de valores em torno de 40 (quarenta) vezes ou 4000% (quatro mil por cento). E aí, vamos importar e desenvolver os outros países ?

Se, em relação à agricultura, os países de primeiro mundo, com os agricultores em situação muito melhores do que os nossos, protegem, por que nós temos que escancarar este setor de vital importância sócio-econômica ? Vejam que no caso da indústria automobilística, na sua totalidade multinacionais, o procedimento não foi bem este. No início da abertura da economia o discurso foi o mesmo e as tarifas de importação baixaram sensivelmente para que o consumidor pudesse ter acesso aos preços e qualidade dos carros importados. Sentindo a diminuição da produção, o lobby das indústrias fez com que, imediatamente as tarifas de importação fos-sem aumentadas, favorecendo a produção nacional. Por que, mais uma vez, como no caso dos bancos, dois pesos e duas medidas, sempre em prejuízo da agricultura ?

A QUESTÃO DA COMPETITIVIDADE

Os agricultores brasileiros não querem privilégios em relação aos países de primeiro mundo, querem apenas as mesmas condições de crédito, subsídios, taxas, impostos, pesquisa, extensão e infra-estrutura. O que não se pode conceber é que, um agricultor europeu receba o dobro do que o produtor brasileiro e este mesmo produto chegue no Brasil por menos preço do que o nosso, como é o caso do leite. Isto ocorre por causa do subsídio. Ou, como no caso do suco de laranja, para proteger os produtores americanos, o Governo dos Estados Unidos coloca tarifas ao importar do Brasil, para que seus agricultores não tenham que baixar o preço, pois nosso preço é menor. Sómente em sobretaxa nas exportações agrícolas o Brasil deixou de arrecadar 5 bilhões de dólares no ano que passou, práticamente o déficit de nossa balança comercial, que muito nos aflige. Os agricultores brasileiros aceitam competir internacionalmente, desde que tenham as mesmas condições que os seus concorrentes. Enquanto isso, devem haver medidas protecionistas, exatamente como fazem os outros países. Também, para estarmos nas mesmas condições de competitividade dos agricultores de outros países, necessitamos ampliar nossos investimenos em pesquisa, extensão e treinamento rural.

PRODUÇÃO E VALOR: ENQUANTO CRESCE A PRODUÇÃO, CAI A RENDA

CARNES*

LEITE

Ano

1.000 ton

R$ milhões

Ano

1.000 ton

R$ milhões

1993 8.702 14.902 1993 15.591 5.145
1996 10.778 12.530 1996 19.021 5.136
Var % +23,8% -15,9% Var % +22,0% - 0,17%

                                           * bovina, suína e frango

GRÃOS**

AGRICULTURA***

Ano 1.000 ton Ano 1.000 ton
1993 75.171 1993 31.077
1996 78.126 1996 30.288
Var % + 3,9% Var % - 2,5%
Var c.p. - 2,5 % Var c.p. - 7,1 %

** algodão, amendoim, arroz, feijão, milho, soja, trigo, mamona e outros.
*** algodão, amendoim, arroz, batata, cacau, café, cana, cebola, feijão,
fumo, laranja, mamona, mandioca, milho, sisal, soja, tomate, trigo e uva.

Fontes: Agroanalysis, Safras e Mercados, ABPLB, Carta HM, Fecotrigo.

 

VARIAÇÃO DE PREÇOS E ÍNDICES - julho de94 a julho de 97

Preço mínimo do arroz 5,09 %
Preço de mercado do arroz 12,08 %
Preço mínimo da soja 16,71 %
Preço de mercado da soja 53,98 %
Preço mínimo do milho 6,02 %
Preço de mercado do milho 8,45 %
Preço mínimo do trigo -10,10 %
Preço de mercado do trigo -4,70 %
Dólar médio 12,98 %
IPR - índice de preços recebidos 20,57 %
IPP - índice de preços pagos 50,08 %
Cesta básica 28,14 %
IGP - DI 79,12 %
INPC 62,58 %
TR 75,49 %
Dívidas agrícolas (sem securitização) 53,45 %

 

OS CUSTOS APÓS O REAL

Verificando os índices da economia após a implantação do Real, observamos que a agricultura foi tremendamente prejudicada. Vejam que, enquanto IPR - Índice de Preços Recebidos pelo Produtores teve um acréscimo de 20,57%, o IPP - Índice de Preços Pagos pelos Produtores 50,08%. (Ambos os índices são calculados pela Fundação Getúlio Vargas). Que atividade ou setor pode conviver com um aumento de custos de 50% enquanto as receitas aumentam 20% ? Considerando ainda que o setor vinha do descasa-mento do Plano Collor, descasamento URV/TR, além de outros problemas. Devemos salientar que o aumento do IPP deve-se ao excepcional desempenho de alguns produtos no mercado internacional, como o caso da soja. Caso contrário, o índice seria menor e em alguns produtos é negativo, como o caso do trigo.

A QUESTÃO DO CÂMBIO

Enquanto os índices que medem a inflação aumentaram 79% (IGP) e 62% (INPC), a relação Dólar/Real foi corrigida em apenas 13%. Isto que dizer que nossa taxa de câmbio está defasada, sendo mantida artificialmente nesta situação, como forma de dar estabilidade à economia. Esta situação faz com que os agricultores recebam menos reais pelo que exportam e também menos pelo que vendem no mercado interno. Como acontece isto ? Ao exportar, o importador paga em dólares, que entram no país, são internados e transformados em reais e pago o agricultor em reais. Considerando que o dólar vale menos reais do que deveria, o agricultor recebe menos.

O mesmo ocorre em relação ao mercado interno. O agricultor sofre a concorrência dos produtos importados, pois uma das regras da globalização da economia é a abertura indiscriminada das fronteiras (ao menos no Brasil). O importador brasileiro paga o exportador estrangeiro em dólares. Para pagar em dólares, é trocado reais por dólares, considerando que o dólar está barato, com menos reais compra mais dólares, barateando o produto importado e pela concorrência, baixando
o preço de quem produz no Brasil. Esta manutenção artificial do preço do dólar favorece as importações e prejudica as exportações, sendo um dos grandes motivos do déficit comercial brasileiro.

 

BALANÇA COMERCIAL x AGRICULTURA

BALANÇA COM.*

AGRICULTURA

Ano

Saldo

Exp. Imp. Saldo
1992 14.951 9.825 2.444 7.381
1993 13.088 10.783 3.796 6.987
1994 10.023 13.805 5.059 8.746
1995 - 3.966 14.893 6.450 8.443
1996 - 5.979 15.363 6.825 8.538

* em bilhões de dólares

 

A IMPORTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA E ESTRATÉGICA DA AGRICULTURA

Quando falamos no aspecto sócio econômico da agricultura, não podemos ficar apenas "dentro da porteira", para uma análise mais real, necessitamos falar no "agribusiness", isto é, em todos os negócios que envolvem o setor, ou seja, incluir os insumos, comercialização, armazenamento, transporte, distribuição e serviços. Englobando estas atividades, o "agribusiness" representa 45% de todo o PIB (produto Interno Bruto) do Brasil e a mesma proporção dos empregos. A todo o momento, todos estão em contato com um produto que a agricultura produziu e fez girar toda a roda da economia. Ex: ao colocar uma roupa, esta originou-se de um agricultor que produziu o algodão, a seda ou a lã, gerou empregos, impostos e agregação de valor desde a aquisição de insumos para o plantio, cultivo, tratos culturais, colheita, transporte, beneficiamento, industrialização para fazer o fio, o tecido e o produto final, comercialização no atacado, distribuição e venda final no varejo. Ao tomar uma cerveja, esta teve as mesmas fases do processo anterior, incluindo ainda a indústria da garrafa, da tampo e do rótulo.

A agricultura tem vital importância estratégica. Um dos principais fatores de crescimento e dominação dos Estados Unidos é a produção agrícola. Vejam que, logo após a grande depressão de 29 (onde quebraram as bolsas e os EUA viveram sua maior crise), o Presidente Franklin Delano Roosvelt fez o grande projeto de recuperação chamado "New Deal", perdoando todos os endividados agricultores (os agricultores brasileira não pedem isto) e investindo dinheiro a longo prazo, interiorizando o desenvolvimento. Consequencia do sucesso de seu plano econômico com base na agricultura, reelegeu-se consecutivamente e faleceu no decurso de seu quarto mandato. Podemo ver que aqui, os métodos para buscar a reeleição são outros. Um dos motivos da dominação americana hoje é a sua produção de alimentos, pois, na dificuldade de outros países produzirem, colocaram embargos no fornecimento de produtos agrícolas fragilizando-os.

Nosso Presidente da República, homem culto e bem preparado, deve estar muito mal assessorado nesta área, pois, quando do movimento "marcha à Brasília", ao receber os produtores, ele disse que deveriam entender o processo de globalização da economia e que isso vem e é irreversível, citando como exemplo a indústria de carburadores de seu Estado. Com a modernização da economia, resultado da globalização, não produz-se mais carburadores e ele nada poderia fazer pela indústria que estava fechando. Ora, comparar carburador com agricultura. Quando o povo não usar mais alimentar-se, beber ou vestir-se com produtos da agricultura, certamente os agricultores não estarão mais reivindicando política agrícola, que não é sómente para eles, mas para toda a sociedade brasileira. Isto mostra que ele não tem a visão da importância estratégica da agricultura.

Após verificar os números da economia, alguns setores do Governo admitem a importância da agricultura e, esperamos
que a manchete do jornal seja transformada em medidas concretas. "AGRIBÜSINESS É MENINA DOS OLHOS DO GOVERNO". O Estado de São Paulo - 26.05.97

PREÇOS MÍNIMOS E CUSTO DE PRODUÇÃO

Pela Lei (Estatuto da Terra), o preço dos produtos agrícolas de-veria ser igual ao custo de produção mais 30%(trinta por cento). Vejam a defasagem entre o preço mínimo fixado pelo Governo e o preço que deveria ser de acordo com a Lei:

Produto Preço Mínimo (R$) Custo
(R$)
Custo
+ 30%
Def.
%
Soja 8,88 11,21 14,57 64,0%
Milho 6,70 7,97 10,36 54,6%

                                               Fonte: Fecotrigo

 

FENAMA - FRENTE NACIONAL DOS MUNICÍPIOS AGRÍCOLAS

Os prefeitos estão iniciando uma organização nacional, junto com as entidades da sociedade civil, com o objetivo de levar adiante e detalhar uma proposta para encaminhar a solução dos problemas agrícolas e contribuir sobremaneira com o desenvolvimento do país. Por isso a importância de fortalecer esta organização.

PROPOSTAS DA FENAMA:

1) FUNDO NACIONAL PARA A AGRICULTURA;

2) SANEAMENTO DO SETOR RURAL;

3) EQUALIZAÇÃO DE CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO COM OS PRODUTORES DE OUTROS PAÍSES;

4) PESQUISA, EXTENSÃO RURAL E TREINAMENTO;

5) GESTÃO DO ITR PELAS PREFEITURAS;

6) PREÇOS MÍNIMOS DE ACORDO COM A LEI.


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